Baseado no TCC das alunas: Lilian Lopes de Moraes e Lívia Maria Rocha Marques
INTRODUÇÃO:
A cefaleia é tida como um dos mais usuais sintomas entre todas as condições dolorosas da prática médica.
Tal diagnóstico, acarreta sérios impactos à qualidade de vida de quem apresenta esta condição, repercutindo não apenas nas questões de saúde, mas também de forma negativa no âmbito socioeconômico do indivíduo e da sociedade como um todo.
Sua alta prevalência e correlação com outros diagnósticos, gera um significativo custo ao sistema de saúde, seja ele público ou privado.
Considerada como uma cefaleia primária comum, a enxaqueca foi classificada como o terceiro transtorno mais prevalente do mundo. (ICHD, 2018).
Segundo a classificação proposta durante o Congresso da Sociedade Internacional de Cefaleia, em Boston nos EUA, ocorrido em julho de 2013, a enxaqueca é considerada uma cefaleia primária e de acordo com a análise dos demais sintomas que acompanham o quadro clínico, é possível definir de forma ainda mais precisa, seu subtipo. (IHS, 2013).
Conforme a 3ª edição de ICHD (2018) basicamente a enxaqueca ou migrânea se divide em dois principais tipos: sem e com aura, sendo o segundo tipo caracterizado por sintomas neurológicos transitórios que precedem ou acompanham o quadro.
Tais sintomas variam de hipo à hiperatividade, depressão, apetite específico para determinado alimento, fadiga, bocejos, irritabilidade, rigidez e ou cervicalgia.
Assim sendo, alguns pacientes, apresentam uma fase sintomática que pode anteceder em dias ou horas o quadro de cefaleia ou até mesmo perdurar após a sua resolução.
A enxaqueca caracteriza-se por uma dor pulsátil, de intensidade de moderada à severa, predominantemente uni, mas também, bilateral, apresenta duração prolongada chegando a perdurar em média de 4 a 72 horas.
A prevalência da enxaqueca atinge em torno de 10 a 20% da população, sendo quatro vezes mais incidente nas mulheres. Acomete predominantemente a faixa etária de 35 a 45 anos, faixa esta, considerada economicamente ativa, o que acarreta prejuízos relacionados à diminuição da produtividade e absenteísmo no trabalho e em eventos sociais. (CAMPANA, et al., 2012).
No entanto, atinge também cerca de 3 a 10% das crianças, afetando igualmente ambos os gêneros antes do início da puberdade, porém predominando em meninas após os 10 anos de idade.
A CEFALEIA PERANTE A VISÃO DA MEDICINA TRADICIONAL CHINESA
De acordo com Vercelino e Carvalho (2010), perante a visão da Medicina Tradicional Chinesa, a cefaleia pode ser classificada de acordo com os canais de energia acometidos.
Quando presente na região têmporo-parietal, a cefaleia é classificada como Shao Yang, pois acomete os meridianos da vesícula biliar e triplo aquecedor. A característica deste tipo de dor de cabeça normalmente é uma dor aguda e latejante.
Ao acometer a região occipital, damos o nome de Tai Yang. Geralmente apresenta rigidez de cervical e parte posterior do tronco. Afeta os meridianos da bexiga e intestino delgado.
Associada aos sintomas de sensação de peso na cabeça, atordoamento, falta de concentração, dor na região posterior orbital, temos a cefaleia tipo Yang Ming, a qual acomete os meridianos estômago e intestino grosso.
Quando apresentada no ápice da cabeça, a dor é tipo surda, diminuindo quando o indivíduo está em repouso. Neste caso os meridianos afetados são fígado e pericárdio e a cefaleia classificada como Jue Yin.
Para Magalhães e Mejia (2012), as dores podem ser por excesso ou deficiência de Qi. A dor de deficiência em geral, tende a ser surda e menos intensa, enquanto a dor de excesso tem por característica ser mais intensa e aguda.
Em toda dor por excesso ocorre uma obstrução do meridiano, impedindo o livre fluxo de Qi, enquanto na dor por deficiência ocorre uma falha na nutrição dos meridianos.
Invasão de fatores patogênicos externos, frio ou calor internos, estagnação de Qi ou sangue, retenção alimentar, presença e fleuma, são exemplos de patologias causadas por condições do exterior.
A falta de Qi e Xue, o consumo excessivo de líquidos decorrente à deficiência de Yin, a estase de sangue, subida repentina do Yang, frio, calor – umidade, são sinais de patologias por deficiência.
OBJETIVO GERAL
Este trabalho teve como objetivo avaliar o resultado no tratamento de enxaqueca crônica mediante a utilização da técnica de ação energética dos pontos.
O trabalho consiste em um estudo de caso, afim de avaliar a ação energética e efetividade de determinado grupo de pontos de acupuntura no tratamento de enxaqueca.
No primeiro atendimento, a paciente recebeu as informações sobre o objetivo do trabalho, e após aceitar fazer parte do mesmo, foi realizado o alinhamento das datas, horário e local onde aconteceriam os atendimentos.
Para avaliar o impacto causado pela enxaqueca na realização das atividades diárias, foi aplicado à paciente um questionário específico conhecido por MIDAS ou Migraine Disability Assessment (Avaliação de Incapacidade por Enxaqueca), antes e após o tratamento.
Ortiz e Raffaelli Jr., (2002) afirmam que o MIDAS (Avaliação de Incapacidade por Enxaqueca), foi desenvolvido pelo médico e professor de neurologia na Faculdade de Medicina Albert Einstein em Nova York, em conjunto com professor de epidemiologia Dr. Walter F Stewart da Universidade de Beltimore.
O questionário consiste em avaliar através de um score o impacto causado pela enxaqueca na rotina da pessoa nos últimos três meses. Atribui-se um valor a cada uma das perguntas do questionário e a somatória permite estabelecer o grau de incapacidade em mínimo, leve, moderado e grave.
O primeiro questionário MIDAS (Avaliação de Incapacidade por Enxaqueca), foi aplicado no final do mês de maio de 2019 e possibilitou a avaliação do período de março a maio de 2019.
Durante o período de tratamento, a paciente foi solicitada a fazer um diário, onde deveria registrar sempre que acometida por crises de enxaqueca. O diário permite que o usuário registre e conheça data, hora, período de duração da crise, região da cabeça acometida e intensidade da dor, bem como fatores desencadeantes, ações de alívio, registro das medicações utilizadas, entre outras questões, facilitando ao profissional de saúde compreender os fatores relacionados ao caso e assim propor um tratamento mais assertivo.
Em cada sessão, a paciente fazia o relato de todas as ocorrências registradas em seu diário durante a semana, e as informações eram repassadas para a sua ficha de atendimento.
Na sequência, foi realizada a entrevista clínica para coleta de dados que iriam nos subsidiar para fechar o diagnóstico energético e escolha da proposta terapêutica.
A paciente foi submetida à 8 sessões de acupuntura sistêmica semanais, com uma hora de duração cada. As sessões ocorreram no período de junho a agosto de 2019.
Optou-se por utilizar a técnica de ação energética dos pontos nos atendimentos, onde iremos discorrer a seguir sobre o tratamento escolhido e resultado do mesmo.
O material utilizado nos atendimentos foi; algodão embebido em álcool 70% para auxiliar na remoção de sujidade e oleosidade da pele, agulhas descartáveis da marca DUX, de tamanho 0,25 x 0,30 mm para estimular os pontos escolhidos para o tratamento, Descarpak para o descarte das agulhas após cada atendimento.
Os atendimentos foram realizados com a paciente deitada em maca, em decúbito dorsal e a sala com a iluminação reduzida após a inserção das agulhas, a fim de promover um ambiente tranquilo e confortável.
O tempo de inserção das agulhas foi de aproximadamente trinta minutos por atendimento.
Os pontos utilizados no tratamento foram: E-36, BP-10, TA-8, VB-20, VB-41, F-3 e VC-6.
Em novembro foi aplicado novamente o questionário MIDAS (Avaliação de Incapacidade por Enxaqueca), para avaliação da paciente ao final do período de tratamento, buscando um comparativo no impacto causado pela enxaqueca na rotina da paciente, antes e após o tratamento.
RESULTADOS
O questionário aplicado antes do início do tratamento, correspondeu ao período entre março e maio de 2019. Conforme os resultados do mesmo, neste período a paciente apresentou quadro de cefaleia em 17 dias, o que correspondeu a 19% do período.
Após o encerramento das sessões de acupuntura, um segundo questionário foi aplicado, o mesmo correspondeu ao período entre setembro a novembro de 2019. A paciente relatou que nos 90 dias após o término do tratamento, apresentou 6 dias de cefaleia, representando 7% do período. Houve, portanto, uma melhora de 12% no acometimento por cefaleia com o tratamento.
Durante os 90 dias que antecederam o início do tratamento, a paciente esteve ausente das atividades laborais durante 9 dias (10%), das atividades domésticas por 8 dias (9%) e sociais por 5 dias (6%). Após o tratamento, houve redução nos dias de absenteísmo laboral e nas atividades domésticas de 4 dias (4%) e nas atividades sociais de 2 dias (2%).
Nota-se que após as oito sessões de acupuntura realizadas, a paciente apresentou uma redução de 24% para 11% na ausência das atividades laborais, domésticas e sociais devido as crises de enxaqueca.
Quanto ao rendimento para a execução das atividades diárias, laborais e domésticas, antes do tratamento a paciente relatou que houve redução em 50% ou mais no rendimento para o trabalho em 13 dias (14%) e para a realização das atividades domésticas em 11 dias (12%).
Ao fim do tratamento, sentiu que o rendimento para as atividades laborais reduziu para 50% ou menos em apenas 8 dias (9%) e para as atividades domésticas por 3 dias (3%).
O baixo rendimento para as atividades laborais e domésticas após o tratamento com a acupuntura sistêmica passou de 27% para 12%.
A segunda parte do questionário consistiu em aferir a intensidade da dor através da escala numérica verbal ENV e classificar o grau de incapacidade por enxaqueca segundo a soma dos resultados da primeira parte do questionário MIDAS.
Conforme Schuman et al (2005 apud RUBBO, 2010, p.18) a escala numérica verbal ENV é um instrumento unidimensional capaz de analisar a intensidade da dor. Assemelha-se à uma régua onde constam os numerais de zero a dez, onde o zero representa a ausência total de dor, dor leve está entre um e três, dor moderada entre quatro e sete, dor intensa entre oito e nove enquanto dez o nível máximo de dor.
De acordo com os resultados do questionário de avaliação de incapacidade por enxaqueca, a intensidade da cefaleia relatada pela paciente, passou de 7 para 4 após o tratamento com a acupuntura sistêmica, o que nos remete à uma vantagem no tratamento, uma vez que com apenas um ciclo de oito sessões, foi possível atingir uma redução significativa na intensidade da dor apresentada pela paciente.
Quanto ao grau de incapacidade por enxaqueca, tanto antes como após o tratamento, se manteve como grave, embora tenha a somatória das primeiras cinco perguntas do questionário tenham reduzido de 46 para 21 pontos.
CONCLUSÃO
O presente estudo mostra que a acupuntura é extremamente eficaz na redução dos sintomas da enxaqueca e na melhora da qualidade de vida das pessoas, uma vez que promove a liberação de substâncias endógenas capazes de modular a dor.
Majoritariamente os estudos mostram que pacientes portadores de enxaqueca crônica apresentaram redução na frequência e intensidade do quadro álgico, bem como dos demais sintomas que acompanham e que antecedem às crises de enxaqueca.
Fica claro, que ao selecionarmos pontos de acupuntura e técnica para o tratamento de qualquer que seja a patologia, é imprescindível se estabelecer corretamente o diagnóstico energético, através da inspeção, ausculta, palpação, avaliação de pulso e língua, bem como levantamento de dados e dos sinais e sintomas através do relato do paciente.
Devemos considerar que a ação energética de um ponto de acupuntura é ampla, um mesmo ponto pode ser indicado ou não para determinado distúrbio, de acordo com o diagnóstico energético estabelecido. Por este mesmo motivo, é relevante conhecermos as ações dos pontos de acupuntura ao elaborar um tratamento.
Esperamos contribuir para a experiência clínica dos profissionais de acupuntura, bem como ampliar as possibilidades para o estudo das ações energéticas dos acupontos para a enxaqueca e outras patologias.
Autora do artigo: Profa. Ma. Luciana Mendes Vinagre