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Estudo de um caso clínico de anemia ferropriva como sinal diagnóstico para a MTC

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Artigo baseado no TCC dos alunos Amanda Draugelis Maluf Bassani e Bruno Cezar Bassani, para conclusão do curso de pós- graduação em Acupuntura do CETN – Bauru.

Neste estudo de caso a ação terapêutica não visou tratar a anemia ferropriva diagnosticada pela medicina ocidental, e sim o padrão energético apresentado pela paciente. No diagnóstico energético concluído, a anemia ferropriva foi um dos sinais a serem trabalhados ao longo das sessões. A busca por alterações ou desaparecimento deste quadro anêmico, constatado pelo hemograma, não foi o foco terapêutico principal. No entanto, a utilização dos conceitos da Medicina Tradicional Chinesa (MTC) para se chegar ao correto diagnóstico energético, e a utilização da técnica de Acupuntura, possivelmente, poderia trazer alterações no exame de sangue.

Na maioria das vezes, a Medicina Ocidental se utiliza de medicamentos alopáticos prescritos com a finalidade de tratar ou eliminar os sintomas, mas a Medicina Tradicional Chinesa (MTC) busca atuar nos desequilíbrios energéticos que causam os sintomas. 

Este estudo está relacionado a alterações no sangue ou XUE, como é conhecido na Medicina Tradicional Chinesa (MTC), como consequência do desequilíbrio energético de alguns órgãos (ZANG) ou de algumas vísceras (FU), é de extrema importância diferenciar qual a representatividade do sangue na Medicina Ocidental e na Oriental, bem como de que forma a própria anemia pode ser vista em cada uma destas linhas de estudo. 

Segundo a Medicina Ocidental, o sangue contém basicamente três tipos de células: os glóbulos brancos (que são parte do sistema imunológico do corpo), os glóbulos vermelhos (que transportam o oxigênio pelo corpo numa substância denominada hemoglobina) e as plaquetas sanguíneas (que ajudam na coagulação do sangue). Os glóbulos vermelhos dependem do ferro para ajudar a armazenar e a transportar o oxigênio para todas as partes do corpo. Seguindo este conceito, a anemia é caracterizada como um quadro no qual existe um número reduzido de glóbulos vermelhos ou uma baixa concentração de hemoglobina. Para a Medicina Ocidental, existem vários tipos de anemia, provenientes de causas diversas. A forma mais comum e popular é a anemia por carência de ferro, denominada anemia ferropriva.  O ferro é um componente fundamental da hemoglobina, a substância que ajuda a armazenar e a transportar o oxigênio nos glóbulos vermelhos. Sem ferro em quantidades suficientes, os glóbulos vermelhos transportam menos oxigênio aos órgãos e tecidos do corpo. Outras formas de anemia podem ser causadas por carência de vitamina B12 ou de folato (ácido fólico) no corpo. Além destas, podemos encontrar também tipos de anemias causadas por alterações genéticas. A deficiência de ferro é responsável por cerca de 50% de todas as causas de anemia.

Na Medicina Tradicional Chinesa (MTC), o sangue (XUE) é considerado como Qi (substrato material e espiritual da vida humana), pois é, em si mesmo, uma forma de Qi, mais denso e material. O sangue (XUE), é um conceito essencial da Medicina Tradicional Chinesa (MTC) e o Qi é o substrato material do universo e dois aspectos são especialmente relevantes. O primeiro é que o Qi é uma energia (medida da atividade de um sistema) que se manifesta simultaneamente sobre os níveis físico e espiritual e, o segundo, é que o Qi é um estado constante de fluxo em estados variáveis de agregação. Quando o Qi se condensa, a energia se transforma e se acumula em forma física.

A paciente deste estudo, tem 38 anos, casada, 2 filhos. Foi diagnosticada com anemia ferropriva aos 13 anos de idade, quando, pela primeira vez, fez um exame de sangue e foram identificadas alterações no hemograma. Durante todo este período, não fez nenhum tratamento direcionado à anemia. Apenas orientada a tomar esporadicamente suplementos como o sulfato ferroso, o ácido fólico e a vitamina B12. Da adolescência à vida adulta sentia inchaço no corpo e acha que melhorou após ingerir quantidade maior de água. Em alguns períodos de sua vida, refere taquicardia, mas não foi a um cardiologista verificar a causa, nem tomou medicamento. Considera-se ansiosa, tem queda de cabelo frequente, unhas fracas e quebradiças; dorme bem, mas relata acordar cansada. Sente cansaço e sono diversas vezes ao dia e diz “lutar” mentalmente para não se render e deixar de fazer o que deve. Quando bebe menos água, sente dormência nos dedos das mãos. Às vezes, sente fadiga nas pernas (incham) e não acha posição para mantê-las sem desconforto. Relata falha da memória em alguns períodos. O hemograma inicial na pesquisa foi realizado em 05/03/2018. Com relação à sua menstruação, relata que o sangue é escuro e às vezes apresenta coágulos. O volume de sangue é grande e não apresenta cólicas.

Diagnóstico energético: Padrão de Deficiência do Qi e Deficiência do Sangue (XUE) causado por Deficiência do Qi do Baço. Evidente pelas manifestações clínicas que incluem, câimbras frequentes, formigamentos nas mãos, perda de memória, irritabilidade, ansiedade, cansaço excessivo, unhas fracas e quebradiças, excessiva queda de cabelo, além da anemia detectada nos hemogramas realizados.

Técnica: Função energética dos pontos. Foram escolhidos acupontos (B17, B18, B20, B21, E36, BP10, F13 e YinTang), que tem relação direta, não só na tonificação destes órgãos envolvidos, mas também interferem diretamente na formação do Qi e do sangue (XUE).

Foram realizadas 8 sessões, duas vezes por semana ao longo de quatro semanas, seguindo o mesmo intervalo de tempo entre uma sessão e outra. As sessões aconteceram regularmente entre os dias 14 de junho e 13 de julho de 2018.

Abaixo, seguem algumas funções, segundo FOLKS, C. (2005), dos oito acupontos selecionados para este tratamento que justificam a sua escolha e utilização para este caso clínico.

1) B17 (GESHU – Shu Dorsal do Diafragma) – Nutre o sangue, alivia o calor do sangue, estimula o fluxo sanguíneo e remove a estagnação de sangue, nutre os fluídos corpóreos, harmoniza o Qi do Estômago e torna o Qi contracorrente do Estômago mais profundo, regula o diafragma, relaxa o tórax e o diafragma, fortalece nos casos de deficiência.

 2) B18 (GANSHU – Shu Dorsal do Fígado) – Regula o Fígado e a Vesícula Biliar, refresca e elimina a umidade-calor do Fígado e da Vesícula Biliar, apazigua o vento interno por meio da técnica de inserção sedativa, remove a estagnação de Qi do Fígado, harmoniza o fluxo de Qi do Estômago, protege os olhos, acalma o Shen-mente.

3) B20 (PISHU – Shu Dorsal do Baço) – Fortalece o Baço e estimula suas funções de transporte e transformação, elimina a umidade e a mucosidade, fortalece o Estômago, nutre o sangue.

4) B21 (WEISHU – Shu Dorsal do Estômago) – Regula e fortalece o “centro” (Baço e Estômago) e suas funções, harmoniza o Estômago e torna seu Qi contracorrente mais profundo, refresca (elimina) o fogo do Estômago, elimina a umidade e a estagnação (de alimentos).

5) BP10 (XUEHAI – Mar de Sangue) – Regula o sangue e a menstruação, remove a estagnação do sangue, sobretudo no útero, refresca o sangue (quando há calor no sangue) e estanca as hemorragias.

6) E36 (ZUSANLI) – Fortalece o Baço e o Estômago, torna o Qi contracorrente do Estômago mais profundo, harmoniza o intestino e dispersa os acúmulos, dissipa os fatores externos patogênicos como o frio, elimina a umidade, descongestiona e regula a circulação sanguínea e de Qi dos Meridianos e dos canais da rede, fortalece a resistência do corpo (o Zheng-Qi vertical)

7) F13 (ZHANGMEN – Porta de Órgãos) – Regula o Fígado e estimula o fluxo harmônico de seu Qi, elimina as endurações e o acúmulo dos alimentos, estimula a circulação sanguínea e remove a estagnação do sangue. Nos casos de inserção tonificante, o ponto F13 fortalece o Baço.

8) YINTANG (Salão Decorado) – Elimina o vento, desobstrui os canais da rede, alivia as dores, descongestiona o nariz, acalma o Shen-mente.

RESULTADO: Primeira Sessão – a paciente referiu melhora em sua disposição, acordou se sentindo melhor e contou que nos dois primeiros dias após a sessão, sentiu seu corpo “formigar” de manhã e de tarde, como se fosse uma espécie de prurido no sangue. Incluiu em sua rotina tomar mais água e percebe que, em determinado momento, não consegue tomar mais. Mudou sua alimentação, diminuindo o consumo de farinha branca e sentiu menos vontade de comer algo doce.

Segunda Sessão – Seu ciclo menstrual foi de 24 dias e adiantou, provavelmente por um pico de stress no trabalho, segundo ela. Percebeu que o volume diminuiu e parecia mais claro do que o normal. Não teve mais o “formigamento” e continua acordando mais disposta e melhor. O cansaço diminuiu chega em casa, vinda do trabalho, e não sente mais necessidade de dormir nestas horas.

Terceira Sessão – Por dois dias continuou sentindo a pontada das agulhas nas costas. Apareceu uma afta (ferida na língua) do lado direito. Passou por uma situação de stress na semana, pois a casa da vizinha foi assaltada. Comeu fora da dieta que estava fazendo e percebeu que acordou mais cansada e com as pernas pesadas. Seu cabelo está um pouco mais forte, pois percebe que está caindo menos ao se pentear. Percebeu que sua pele está mais hidratada e seu calcanhar não está mais rachado. Tem tomado mais água durante o dia e ido bastante ao banheiro para urinar. Está se sentido mais saciada com menos quantidade de comida no prato.

Quarta Sessão – Refere não sentir mais as pontadas das agulhas após as sessões. Continua com apetite menor e se satisfazendo com menor quantidade de comida. Percebeu que suas unhas não estão quebrando. Continua sentindo o cabelo caindo menos (“mais firme”) e pele melhor. O cansaço nas pernas e a dormência nas mãos sumiram.

Quinta Sessão – Melhora no cabelo e a diminuição do apetite. Se come algo diferente do que está habituada, percebe que fica mais difícil acordar no dia seguinte. Após a quarta sessão, sentiu os pontos que foram agulhados em alguns momentos como se estivessem se mexendo, principalmente os das costas (Shu Dorsais) e o F13 (ZHANGMEN). Contou que faz as mesmas atividades e acorda disposta, sem o cansaço que sentia antes. Sua panturrilha era “dura” e dolorosa e, ao apalpar, refere que “amoleceu”. Acha que seu tornozelo está mais fino, como se tivesse desinchado.

Sexta Sessão – Estava se sentindo inchada por causa da menstruação que viria e com vontade de comer alguns alimentos diferentes do habitual (especialmente doces). Relatou novamente a unha mais forte e o cabelo caindo bem menos. Comeu farinha branca depois de bastante tempo sem e percebeu que acordou mais cansada e com olheiras.

Sétima Sessão – Menstruou novamente em um ciclo de 27 dias (relatou que teve outro pico de stress e pode ter adiantado por causa disso). Relatou que a qualidade do sono está bem melhor, não sente mais câimbras e nem o corpo doído.

Oitava Sessão – Fluxo menstrual não foi intenso como o de costume e estava sem coágulos e com um vermelho mais claro. Percebeu melhora ainda maior nos cabelos. É possível perceber cabelos novos nascendo na inserção do couro cabeludo.

No decorrer das sessões a paciente apresentou melhora em sua auto-estima, aumentando a sua percepção de educação em saúde e procurou uma alimentação mais adequada. Isso ocorreu pois, após a conclusão do Diagnóstico Energético, foi orientada com relação à importância de uma alimentação mais equilibrada, saudável e nutritiva do ponto de vista da Medicina Tradicional Chinesa (MTC). É possível evidenciar, a partir dos relatos acima, a grande melhora das manifestações clínicas apresentadas pela paciente com o tratamento de Acupuntura.

Para informação complementar, a paciente procurou, ao final das sessões, realizar um novo hemograma no mesmo Laboratório de Análises Clínicas onde havia realizado o primeiro exame. No comparativo dos exames antes e depois das sessões, com intervalo de quase 5 meses entre um e outro, verificou-se que, do primeiro exame realizado no dia 05 de março de 2018 e o segundo no dia 27 de julho de 2018, de acordo com a metodologia utilizada para a realização de hemograma, a paciente não pode ser mais considerada anêmica, pois a hemoglobina passou de 9,3 g/dL para 12,5 g/dL, ou seja, está dentro do intervalo de normalidade nesta metodologia, que compreende o intervalo de 11-16 d/dL (contagem, dosagens e citologia realizados em autoanalisador MINDRAY BC 2300). 

O resultado positivo alcançado após as oito sessões de Acupuntura, refletido através da melhora significativa das manifestações clínicas aos olhos da Medicina Tradicional Chinesa (MTC), confirmam que a anemia ferropriva, patologia diagnosticada através de exame laboratorial, habitualmente utilizado pela Medicina Ocidental para fechamento de quadros diagnósticos, também pode ser utilizado como um sinal diagnóstico no tratamento com a Medicina Tradicional Chinesa (MTC), caso o paciente disponha do hemograma e apresente ao terapeuta.

A Medicina Tradicional Chinesa (MTC), através da Acupuntura, deve ser considerada uma ferramenta eficaz no tratamento de deficiências do sangue (XUE) ou anemia para a Medicina Ocidental, visto que, além da melhora no que se refere às manifestações clínicas apresentadas pela paciente, a utilização desta técnica pode também comprovar a sua eficácia na melhora dos parâmetros do hemograma.

Outro ponto não menos importante que merece destaque nesta conclusão de estudo de caso é a fácil aplicabilidade da Técnica de Acupuntura, por não precisar de aparatos tecnológicos, além da excelente relação entre custo e efetividade desta terapia milenar como ferramenta eficaz nestes quadros clínicos considerados de saúde básica ou primária.

AUTORA DO ARTIGO: Carla Ceppo.

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